quarta-feira, 4 de maio de 2011

Nove anos da Lei de Libras e temores de Martinha Claret


Emiliano Aquino - Ouvinte, doutor em Filosofia e pai de surdo
emiliano.aquino@yahoo.com.br

No último dia 24 de abril comemoramos nove anos da Lei 10.436, que estabeleceu a Língua Brasileira de Sinais (Libras) como língua nacional dos surdos. O Decreto 5.626/2005 ampliou essa conquista das comunidades surdas, ao reconhecer a Libras como principal manifestação de sua cultura. Por isso determina o ensino obrigatório da língua de sinais ao aluno surdo desde a educação infantil.

Toda a instrução para o surdo deve ser em Libras, sendo o Português, em sua modalidade escrita, sua segunda língua. Nos exames em Português têm os surdos o direito a serem avaliados levando-se em conta elementos semânticos em detrimento dos aspectos formais de nossa língua.

Diz também o Decreto que os surdos devem ser incluídos no sistema educacional sob duas formas: na educação infantil e nos primeiros anos do ensino fundamental, em classes e escolas bilíngues que têm a Libras como primeira língua e o Português escrito como segunda língua, devendo os professores ser bilíngues; e, nos anos finais do ensino fundamental, no ensino médio e na educação profissional, em escolas bilíngues ou em escolas comuns da rede regular de ensino – nesse caso, porém, as escolas devem oferecer intérpretes de Libras.

A língua e o desejo do outro são as duas barras que mais radicalmente nos remetem à morte, e antes de tudo à nossa própria, pois, como esta, se nos apresentam como o mais completamente indevassável, incontrolável, incognoscível.

Onde há uma língua, há um mundo, disse-nos Saramago; por isso a língua do outro é sempre um mundo que nos foge completamente às mãos. Isso talvez explique por que permanece na Secretaria de Educação Especial do MEC a anekofobia, a intolerância doentia e persecutória à língua e à cultura surdas, que despreza tudo o que determina a legislação sobre a Libras (ou, simplesmente, a Lei!).

Convencida de que sua contribuição para o desenvolvimento da civilização é a padronização da humanidade (projeto de todo perverso), Martinha Claret, Diretora de Políticas Especiais da SEEsp/MEC, pôs-se a tarefa de abolir a educação bilíngue para surdos, chegando a anunciar há algumas semanas o fechamento da Escola do Instituto Nacional de Educação de Surdos, sendo felizmente desautorizada pelo Ministro Haddad. “Não há cultura surda”, disse d. Martinha; “os surdos não podem estar numa escola de surdos só porque são surdos”, arrematou em seu brilhantismo lógico.

Ao arrepio da legislação sobre a Libras e dos direitos constitucionais, que garantem o pluralismo pedagógico e a liberdade de ensino, a comissionada do Ministério não obedece ao Decreto em que figura a assinatura de seu chefe. Em sua disposição para matar um mundo que lhe é opaco, a amedrontada Martinha está disposta a ir bem longe; mas talvez tenha, porém, que se defrontar com a cultura surda, que não parece estar disposta a morrer. Ao medo da morte se contrapõe o culto à vida.

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